A historiadora Edianne Nobre reconta nas páginas deste livro a já tão tratada história do milagre de Juazeiro e da própria cidade da qual é filha. Mas este texto é marcado pela tomada de uma atitude historiográfica inovadora ao deslocar a centralidade destas histórias da figura do Padre Cícero Romão Baptista para enredá-las em torno das práticas e falas de oito beatas; mulheres que, como a sempre referida Maria de Araújo, participaram intensamente dos eventos que culminaram com a abertura de dois inquéritos episcopais e com a excomunhão do padre de Juazeiro. Mulheres que foram submetidas a um processo de silenciamento, tanto no decorrer dos próprios acontecimentos, sendo pressionadas e intimidadas pelas autoridades religiosas para que negassem as visões beatificas e os fatos extraordinários dos quais diziam ser agentes e testemunhas, quanto na própria historiografia sobre o milagre de Juazeiro, que, muitas vezes, sequer se refere à existência destas outras beatas. Coube a Edianne tomar a atitude de pensar a história do silêncio em torno dessas mulheres, de como ele se produziu, de pensar que práticas discursivas e não-discursivas produziram este silenciamento e como ele foi estratégico para que se elaborasse a versão hegemônica da história do milagre e de Juazeiro, que gira em torno da figura do Padre Cícero.
O livro O Teatro de Deus significa também uma nova atitude quando se trata de relacionar história e espaços. Sendo fruto de uma Dissertação de Mestrado, defendida no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, cuja área de concentração trata dessa relação, o livro de Edianne se dedica a pensar a constituição histórica de um espaço sagrado, de um espaço de crença, de um espaço de peregrinação religiosa, como é até hoje a cidade de Juazeiro do Norte.