sem título
cloto tece.
ela tinha nove anos quando leu pela primeira vez sobre as moiras. ficou encantada com a ideia de que cada um de nós, quando ainda é poeira estelar, tem o destino traçado por uma mulher. imaginava pra si uma vida tecida como a das personagens que enfeitavam seus livros de história. amazonas, guerreiras, feiticeiras. resistentes como a linha que cloto usava para compor sua teia.
laquesis mede.
aos catorze, maldisse sua vida torta, com tantos obstáculos e exigências. tanta falta de amor, compreensão, dinheiro. aos vinte e três deixou de acreditar em destino. terminou a faculdade, começou a trabalhar, casou e foi feliz no primeiro ano antes de engravidar e seu marido começar a lhe bater. conjeturava sobre o tamanho da urdidura que laquesis havia feito para ela. esperava que não fosse tão grande.
átropos corta.
aos trinta e seis acordou cedo, fez café e ovos mexidos, esperou o marido ir trabalhar e a filha sair pra escola. tomou um longo banho, disfarçou o olho roxo com corretivo, vestiu sua melhor roupa, pegou uma bolsa e saiu casa. na esquina da rua parou pra pensar aonde iria, no mesmo instante em que uma mulher derrubava um vaso da janela do nono andar.
o corte de átropos penetrou sua carne como uma faca butterfly, essas que entram suavemente e se abrem em tesoura por dentro.

Deixe um comentário